Vinte e três das 27 Casas Legislativas estaduais tiveram desempenho considerado insatisfatório no Índice de Transparência e Governança Pública (ITGP), ranking da Transparência Internacional – Brasil que avaliou, pela primeira vez, a transparência dos Legislativos estaduais sobre informações como o uso de cotas parlamentares, viagens oficiais, normas de regulação do lobby, presença de deputados em plenário e salários pagos a servidores e aos próprios deputados.
Em uma escala de 0 a 100, apenas quatro Casas Legislativas receberam a classificação “bom” — Distrito Federal (com 75 ponts), Espírito Santo (71), Minas Gerais (69,8) e Ceará (60). Nenhuma Assembleia Legislativa obteve a classificação “ótimo”.
Por outro lado, doze Assembleias Legislativas foram classificadas como “regular”, oito como “ruim” e três como “péssimo” (veja tabela completa abaixo) em relação a 62 indicadores que mediram mecanismos e práticas de transparência, de prevenção e combate à corrupção e de incentivo à participação popular.
O índice avaliou as 26 Assembleias Legislativas e a Câmara Legislativa do Distrito Federal através de oito dimensões: Legislação, Plataformas, Governança, Transparência Legislativa, Transparência Administrativa, Comunicação, Participação e Engajamento, e Transformação Digital.
O detalhamento das notas indica que os maiores desafios para assegurar transparência e participação social se concentram na dimensão Legislação, que monitora a existência e a regulamentação de leis e normas que amparam a transparência e a integridade, cobrindo temas como lobby, proteção a denunciantes, dados abertos e proteção de dados pessoais. Dez estados zeraram a pontuação em todos os itens dessa dimensão (Rio Grande do Sul, Paraná, São Paulo, Rondônia, Santa Catarina, Sergipe, Amazonas, Rio de Janeiro, Piauí e Acre).
Um dos casos mais alarmantes está relacionado à criação de normas para regulamentar as atividades de lobby. De acordo com a avaliação do ITGP, nenhuma das 27 Casas Legislativas possui regras para a divulgação de reuniões ou interações de agentes públicos com grupos de interesse.
Renato Morgado, gerente de programas da Transparência Internacional – Brasil, explica que a avaliação feita pelo ITGP mostra que não há relação direta entre o tamanho do estado ou seu desenvolvimento econômico e os resultados de transparência e boa governança dos órgãos avaliados naquele mesmo estado. “Estados pequenos conseguiram melhores resultados que estados grandes e mais ricos. Isso demonstra que, mais do que recursos financeiros, é necessário vontade política para implementar medidas que vão aproximar os cidadãos dos seus deputados. As mesas diretoras das assembleias que assumiram no início desse ano nas novas legislaturas estaduais possuem uma grande oportunidade de promover avanços em seus mandatos”, ressalta.
Dentre os aspectos positivos identificados pelo ITGP, viu-se que a maior parte das Assembleias Legislativas regulamentou a Lei de Acesso à Informação (16 delas), possui portais da transparência (25), e divulga informações sobre suas comissões (26). Boa parte das assembleias também transmite suas sessões do plenário online (17) e todas divulgam os contatos dos parlamentares das legislaturas atuais (27). Esses esforços, todavia, são iniciais e representam apenas as etapas mais elementares para a garantia da transparência no Poder Legislativo brasileiro.
Essas e outras boas práticas para garantir mecanismos de transparência e integridade no Legislativo estão detalhadas em um guia elaborado pela Transparência Internacional – Brasil em parceria com a Fundação Konrad Adenauer.
Divulgação de salários poderia inibir casos de “rachadinha”
Esquema que ganhou o noticiário nos últimos anos com casos em diferentes Casas Legislativas, a “rachadinha” — prática ilegal de reaver parte do salário dos funcionários de gabinetes parlamentares para uso pessoal ou político do deputado – poderia ser inibida com a promoção da transparência sobre o salário dos servidores das Assembleias Legislativas. Os resultados do ITGP mostram, no entanto, que somente quatro estados (Ceará, Espírito Santo, Goiás e Rio Grande do Sul) publicam bases de dados completas e nominais, com periodicidade mensal, sobre o salário de servidores efetivos e comissionados. Onze Casas Legislativas não pontuaram nada nesse critério.
Segundo Guilherme France, gerente de pesquisa da Transparência Internacional – Brasil, “temos visto escândalos de corrupção em Casas Legislativas por todo o Brasil e, em muitos casos, são esquema de ‘rachadinha’ envolvendo parlamentares e servidores. Parece, pelo nome, que rachadinha é um problema menor, mas se trata de crime de peculato, ou seja, desvio de recursos públicos. Além de prejudicar a atuação parlamentar, porque muitas vezes os funcionários são fantasmas ou colocados em situação de coerção, esse tipo de prática prejudica a legitimidade dos parlamentos e enfraquece a democracia. Mais transparência é essencial para prevenir e detectar precocemente ‘rachadinhas’ no futuro”.
O Índice de Transparência e Governança Pública também avaliou mecanismos de participação dos cidadãos nas Assembleias Legislativas e constatou que sete casas ainda não possibilitam que a população faça denúncias de corrupção em seu site. Ainda mais grave, no entanto, foi a constatação que nenhuma Assembleia Legislativa do país prevê medidas para proteção de denunciantes de corrupção.
“É preocupante nenhuma Casa Legislativa possuir mecanismos para proteção dos denunciantes de casos de corrupção. Segundo outro estudo da Transparência Internacional, 69% das pessoas acreditam que podem sofrer retaliações se denunciarem casos de corrupção. Para combater a corrupção, as Assembleias Legislativas precisam proteger quem denuncia injustiças e irregularidades através de mecanismos que garantam proteção contra retaliações, além de anonimado e completa confidencialidade”, afirma Nicole Verillo, gerente de apoio e incidência anticorrupção da Transparência Internacional – Brasil.
Sobre o índice
O Índice de Transparência e Governança Pública foi publicado pela primeira vez em julho de 2022, com a avaliação dos níveis de transparência dos Executivos estaduais e distrital de todo o país.
Também em 2022, foi publicada a primeira rodada do ÍTGP de cerca de 200 prefeituras brasileiras, avaliadas por organizações parceiras da TI Brasil, que receberam suporte para aplicar uma variação da metodologia estadual. Em 2023 será publicada uma segunda rodada desta avaliação.
A regularidade da publicação busca incentivar a elevação contínua de padrões e oferecer um mecanismo permanente de monitoramento e promoção da transparência e da boa governança na administração pública.
Sobre a Transparência Internacional – Brasil
A Transparência Internacional é um movimento global com um mesmo propósito: construir um mundo em que governos, empresas e o cotidiano das pessoas estejam livres da corrupção. Atuamos no Brasil no apoio e mobilização de grupos locais de combate à corrupção, produção de conhecimento, conscientização e comprometimento de empresas e governos com as melhores práticas globais de transparência e integridade, entre outras atividades. A presença global da TI nos permite defender iniciativas e legislações contra a corrupção e que governos e empresas efetivamente se submetam a elas. Nossa rede também significa colaboração e inovação, o que nos dá condições privilegiadas para desenvolver e testar novas soluções anticorrupção.