Por Silvana Coelho
Nas pequenas cidades do Brasil, antes do programa de interiorização das universidades, era comum que as famílias de classes média e alta enviassem seus filhos para estudarem os últimos anos escolares na capital, aumentando a chance de ingresso nas universidades públicas.
O conforto da estadia dos filhos na capital era proporcional as posses das famílias. As de maior renda alugavam apartamentos que eram gerenciados por empregados de confiança ou avós. Ou enviavam os filhos, especialmente as moças para pensionatos de luxo, que tinham rígidas regras de conduta.
Mas existiam também pensionatos improvisados em pequenas casas de classe média baixa, que recebiam jovens de renda similar, que conviviam junto à família, compartilhando quartos e banheiros.
Certa vez, uma família de classe média baixa do interior da Bahia, que tinha três filhas, enviou as duas filhas mais velhas para estudarem na capital, hospedadas nos tais pensionatos mais simples. A mãe, que morava em uma casa com quintal onde havia mangueiras e goiabeiras, sempre que tinha portador para a capital enviava frutas para as filhas. Zelosa, quando as frutas estavam ficando maduras, as protegia com saquinhos para evitar a bicada dos passarinhos e insetos. Através das frutas bem cuidadas, as moças recebiam com grande alegria este carinho familiar.
Quando chegou a vez da filha mais nova ir estudar na capital, a família tinha progredido financeiramente. A filha mais nova morou em um pensionato de classe média alta e estudou em escola privada. Teve oportunidades que as mais velhas não tiveram.
A memória é seletiva. Quando contam esta história familiar, a filha mais nova não se refere as facilidades que teve por ter vivido na capital com maior conforto financeiro. Refere-se a injustiça que sofreu na vida, porque quando as irmãs moravam na capital, ela, que continuou com os pais no interior, nunca conseguia comer as frutas mais bonitas do quintal. As que eram protegidas com saquinhos e enviadas para as irmãs mais velhas.
É certeza que a memória é seletiva. Mas qual o critério para a seleção?
—————————————–
Ortodontista e doutora em gestão