AS FÉRIAS DA MORTE

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Por Elieser César

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A morte resolveu tirar férias; não porque estivesse cansada de ceifar vidas (sua obrigação cósmica e constitucional). Afinal era-lhe agradável responder pelo equilíbrio da balança do mundo.
Não fosse seu imemorial e eficiente trabalho, o planeta não suportaria o peso de tantas vidas juntas, sobre a terra, o ar e sob o mar.
Com esse repentino descanso, primeiro, em Tucano, na Bahia, foi suspenso o estertor final de Dona Mariazinha da Caueira, quando já recebia a extrema unção.
Em Curitiba, a corda que enforcaria o suicida Hermílio Hansen não obedeceu ao comando da física.
Em Kandahar, Muhammad Salif não consegui explodir, no saguão de um hotel, a bomba que amarrara à cintura.
Em Kyoto, Hoshida Namaturi não logrou encontrar a espada com a qual pretendia se eviscerar.
Em Salvador, uma bala perdida estancou antes de atingir um estudante. Em São Petesburgo, Vladmir Ivanovicht Plankov, se livrou de uma roleta russa.
O operário Ji Chang não caiu de um andaime em Pequim.
O jovem toureiro Juan Manuel de La Cruz, num momento de distração,
se safou, da cifrada do touro.
Em Mumbai, um trem superlotado não descarrilhou sobre um despenhadeiro.
Na costa da Itália, um barco abarrotado de refugiados africanos não naufragou.

2

O fenômeno não passou despercebido da imprensa carniceira.

NINGUÉM MORRE

Foi a manchete
preocupada das hienas midiáticas.
Padecendo de câncer terminal, o redator comemorou, secretamente, o sursis da morte.
Sem fatal e temida punição, as igrejas ficaram vazias e o desregramento se alastrou em todo o mundo. A vida era eterna! Só prazer e bonança.

3

Até que a morte cansou do ócio e, como um glutão submetido à rígida dieta, retornou mais voraz.
Primeiro voltou a Tucano. Depois foi completando a colheita adiada. E avançou muito mais.
Capaz de estar, bem agora fungando em seu cangote, impressionável leitor.
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Jornalista e escritor