CHICO MACEDO E SUA ARTE ANTENADA COM O UNIVERSO

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Por Reynivaldo Brito

O artista Chico Macedo é um dos mais criativos da Geração 80 na Bahia e tem uma influência sutil do barroco nas suas obras contemporâneas. Foi premiado no I e no II Salão Universitário em 1988 e de 1990, respectivamente. Já expôs no Espírito Santo, Goiânia e em São Paulo no Museu de Arte Contemporânea, MAC, em São Paulo e até mesmo em Paris, na França, na Galeria Leonardo. Vive antenado com os acontecimentos que ocorrem não apenas no seu entorno, mas também onde pode sua sensibilidade alcançar. Tem preferência de se expressar através a xilogravura criando imagens do inconsciente e realizando uma composição com formas e objetos do seu cotidiano. Vejo que nas pinturas também essas imagens surgem  até mesmo nas lembranças da sua infância quando lia as Histórias em Quadrinhos . Sua produção artística não é aleatória e sim  fruto das informações que dispõe e de sua escolha dentro de critérios  de uma formação artística.

 Durante os  quase dois anos da pandemia que se abateu sobre os habitantes deste Planeta, quando milhões morreram vítimas de um misterioso vírus vindo da China, ele passou na sua casa-ateliê na Ilha de Itaparica. Disse que neste período produziu bastante e se sentiu privilegiado por morar numa casa num condomínio fechado perto da praia e sempre que podia saía para espairecer olhando o mar. Mas, que as mortes de seus pais durante a pandemia foram um golpe muito forte e talvez estejam refletidas nas obras que produziu quase todas com a prevalência da cor preta, algumas relacionadas com o tempo, à tristeza e às lembranças. Numa delas tem um fotógrafo lambe-lambe tirando um retrato 3 x4 recordando na sua primeira  Carteira de Identidade . Esta obra traz no seu conteúdo a lembrança da sua juventude quando foi juntamente com seu pai para a Praça da Piedade tirar este retrato para sua primeira Carteira de  Identidade para se matricular no colégio. Noutro que denominou O Filho de Cronos ele se refere ao Deus da mitologia grega relacionado com o tempo, juntamente com Uranos e Zeus. O Cronos é o tempo mensurado, com dias, meses e anos, enquanto o Kairos significa o momento certo e oportuno, o tempo da graça de Deus.

Lembra a cena do assassinato do soldado 
que protestava contra o lock down da
pandemia no Farol da Barra.

Estes acontecimentos bateram forte na sensibilidade de Chico Macedo, porém sua reação ao invés de paralisar o impulsionaram a continuar pintando. Ao examinar as suas obras vemos que ele tem um caminho próprio de criar e que as figuras e objetos que inclui nas suas composições fluem livremente do seu inconsciente ganhando os espaços e o seus protagonismos próprios. Ele já usou peneiras de palha, papel maché, telas de pano para pintar com tinta acrílica e madeira nas xilogravuras. Recentemente descobriu uma placa de pvc que é utilizada na construção civil e está usando como suporte. Para Chico Macedo essas placas têm uma vantagem muito grande em relação ao papel porque como vivemos numa cidade com muita unidade os fungos quase sempre atacam o papel amarelando e deixando manchas. É verdade. Eu tenho algumas obras aqui emolduradas que estão amareladas e com manchas necessitando de um trabalho de restauro. Segundo ele as placas estão livres de amarelar e de serem atacadas por fungos.

                                                       QUEM É

Quando perguntei o seu nome completo o artista foi logo dizendo que tanto o seu como dos cinco irmãos foram inspirados em nomes de santos da igreja católica. Seu nome completo é Francisco de Assis Vieira Macedo é filho de Manoel Antônio de Macedo e de Josefa Vieira de Macedo, que era de Petrolina,Pernambuco. Ele nasceu em onze de abril de 1963 em Juazeiro no interior da Bahia, às margens do Rio São Francisco. Considera que seu trabalho artístico tem uma herança barroca devido a esta ligação de seus pais com o catolicismo. Desde cedo que a família frequentava com certa assiduidade a igreja e lá ficava observando as imagens e os detalhes dos templos. Fez questão de assinalar que seus pais tiveram uma influência muito grande na sua formação e os tem como uma referência positiva. Fez o curso primário na Escola Edson Ribeiro. Depois vieram para Salvador quando ele tinha dez anos de idade, porque sua irmã mais velha fez vestibular, foi aprovada e seu pai passou a trabalhar na Assembleia Legislativa.

Obra de Chico Macedo mostrando o
monstro com suas inúmeras garras em
 busca da vítima

Ao chegarem em Salvador sua mãe d. Josefa Macedo levou os filhos para conhecer as principais igrejas da Cidade e também algumas praias. Chico Macedo lembra do choque ao ter o ´primeiro contato com o mar e ver aquela imensidão  azul. “Foi um choque porque conhecia o rio São Francisco e o seu entorno com o clima do sertão e agora estava diante do mar com uma atmosfera completamente diferente. Disse que durante a pandemia ficou refletindo sobre a importância dos rios e do mar para a humanidade. O Rio São Francisco em particular, onde convivi desde criança desempenhou ainda desempenha um importante papel para milhares de pessoas. Antes foi um dos caminhos para o povoamento e quantas cidades surgiram nas suas margens. Lembrei que os rios correm para o mar e que eu sai de Juazeiro e também vim para Salvador uma cidade praieira.”

Chico Macedo, Joelino Ferreira, falecido, 
e Jackson Haje na Escola de Belas Artes.

Aqui estudou no Colégio Nobel onde concluiu o curso e em final de 1983 fez vestibular para a Escola de Belas Artes. Disse que foi um período muito criativo e que “os dias e as  noites pareciam que duravam para sempre”. Saíamos com um violão debaixo do braço para os quatro cantos da Cidade. Íamos e voltávamos tranquilamente sem qualquer preocupação com a violência. Curtimos muito a vida e hoje me assusta terrivelmente esta violência que estamos enfrentando. Meu Deus do céu como as noites nos anos 80 eram maravilhosas! Intermináveis! A gente voltava e até de carona de estranhos  sem preocupação com o  perigo.” Continuou mostrando sua preocupação com a violência. Mora há dez anos na ilha de Itaparica, numa casa num condomínio fechado e disse que desfruta de certa tranquilidade e segurança.

                                           MUITA ATIVIDADE

Relembrou que os dias e as noites nos anos 80 a Escola de Belas Artes eram preenchidos por  uma vida ativa de produção. Os professores e estudantes ocupavam as salas de aulas, de pintura e de gravura produzindo. Era uma efervescência e os alunos gostavam daquele ambiente. Tinhámos uma convivência saudável. Quantas vezes fiquei com o professor de gravura Michael Walker – ele se refere ao então professor Michael Eric Adolph Walker, Doutor em Belas Artes pela Universidade de Barcelona – Espanha, que ensinou um período na Escola de Belas Artes da UFBA e ao se aposentar foi morar na Europa. Não era só aquela relação do educando em somente assistir às aulas naquele período . A Escola era presente, funcionava mesmo com intensidade.  Outro dia estive na Escola e senti àquele vazio. Poucos alunos. As salas vazias, educandos apáticos. Não é saudosismo, e nem porque estou com sessenta e um anos de idade. Confesso que saí entristecido.” Fomos a tantas exposições inclusive fora do Estado e ainda éramos estudantes”. Tem uma frase que diz “não volte para onde um dia você foi feliz”. Isto porque as pessoas não são as mesmas, tudo está modificado e você vai se sentir que aquela local  não tem mais qualquer ligação com você. Será um estranho naquele lugar.

Nesta obra vemos o Fantasma das revistas 
em quadrinhos ameaçado pelo gorila.

Quando perguntei como se sentiu ao concluir seu curso na Escola de Belas Artes em 1988 e  enfrentar o mercado de arte? Respondeu brincando que “foi um choque térmico. Participei de vários salões, sendo premiado em alguns e vieram os filhinhos. O primeiro foi quando morei no Espírito Santo. De lá fui morar em Goiás onde fiquei quatro anos e veio novo relacionamento e uma filha. O terceiro filho foi com uma colega de profissão, e finalmente veio a caçulinha, que espero ser a última, de um relacionamento com uma paulista.” Chico Macedo tem um jeito peculiar e afetivo de falar não apenas da sua arte como também do seu jeito de ver a vida. Para ele os relacionamentos não deram certo porque as pessoas costumam exigir e reclamar de tudo. O time dele é diferente. 

Trabalhou na Fundação Mãe, que tem sede no Ogunjá e ensinou Educação Artística numa escola no bairro de Canabrava.  Na época existia nas proximidades o lixão que estava em atividade e que depois foi aterrado e construído o Barradão e o bairro se expandiu. Em seguida ensinou na cidade de Camaçari, na região Metropolitana de Salvador. Recentemente deu entrada na sua aposentadoria porque disse ter uma comorbidade de pressão alta e que por ter trabalhado em Canabrava recebeu o atestado de insalubridade e assim reduziu o tempo para se aposentar.  

O nosso encontro aconteceu no meu escritório no edifício Mundo Plaza e ao olhar algumas obras nas paredes ele relembrou de sua infância com sua mãe lhe levando para visitar as igrejas. “Vejo aqui que esses trabalhos trazem no seu bojo um barroquismo.

 Eles estão carregados de informações. Percebo o barroquismo até nas xilogravuras do cordel.” E continuou : “Nas pinturas que estou fazendo agora tem uma herança da gravura e as cores estão surgindo bem devagar. Estava muito assustado com a pandemia com a morte de meus pais e de amigos queridos. Claro que este sofrimento com as perdas me assustou muito e ficava pensando que eu poderia ser a próxima vítima. Foram momentos angustiantes, mas superei. Felizmente moro numa casa à beira mar e aí saía para espairecer, ver a beleza do mar, as ondas no seu vaivém e ainda conseguia comprar uma cervejinha e assim o tempo passava.” Acredita Chico Macedo que com o passar do tempo à medida que for pintando as cores tendem a aparecer com mais intensidade. Estava pintando coisas pequenas de 50 x 40, mas já está pintando em suportes de mais de um metro.

Revelou que  “era um crítico ferrenho de terapias. Dizia que eram enganadores e hoje estou fazendo e me sentindo muito bem. Só o fato de ter alguém disposto a me ouvir ajuda muito. Levo as obras de arte e fico falando sobre meu processo de criação. Tudo isto refletiu em cada obra que fiz.”

Num texto que me enviou intitulado O Lugar Que Não Existe Mais o artista Chico Macedo diz: “Lembro que os maiores influenciadores para essa jornada, foram meus pais, isso, em um tempo analógico me deixa em pânico. Quando mergulhamos fundo no passado, trazemos boas memórias e junto com isso, vem imagens que queremos apagar de alguma maneira ou transformá-la.”

Hora de dialogar sobre a vida .
Acrílica sobre placa de PVC.

“Esse medo foi forjado ou tomou corpo, durante a pandemia onde o isolamento e o pavor contra o vírus, me fez procurar alternativas através da arte. A memória não é um lugar lacrado, mas quem não sabe o caminho a tomar, qualquer beco serve. Por isso, o caminho da memória foi a porta para os desenhos se abrigarem. Hoje vejo que essas imagens são um testemunho de experiências com valores diversos, positivos e negativos com impactos profundos. A ausência é contínua, quando lembro desse universo analógico, lembro que comecei por aí. Esse momento novo revelou uma capacidade difícil de enfrentar. 

A natureza gosta de explodir em cores e diversidades, assim como alguns humanos fazem. Sabemos que a arte é o legado de nossa cultura é a que afirma a nossa identidade, documentando nossa história, embora enriquecida com metáforas e imaginários diversos em geral cada universo de expressão, traz à tona suas verdades ocultas, ativando a fertilidade das coisas”. 

                                                      EXPOSIÇÕES E  PRÊMIOS

Chico Macedo no Salão de Feira de
Santana, em 1999

E1988 – I Salão Universitário com Conjunto de Pinturas- Salvador- Ba; 1990 -II Salão Universitário com Conjunto de Pinturas – Salvador- Ba; 1991 –  

I Bienal do Recôncavo; 1994 –

I Bienal Internacional Afro-Americana de Cultura – Salvador – Ba ( foto ao lado), I Salão do Museu de Arte Moderna da Bahia  ; 1995 – III Bienal do Recôncavo; XI Salão Regional de Artes Plásticas da Bahia ; 1997 -Salão dos Novos Valores – Goiânia – Goiás ; 1998 – IV Bienal do Recôncavo- São Felix- Ba. – Prêmio Aquisição;  Tropicália 30 Anos – 40 Artistas Baianos; –1999 -XXIII Salão Regional de Feira de Santana Ba. – Prêmio oficial; 2000 – Exposição Individual na Galeria ACBEU, Slvador-Ba; 2000 – V Bienal do Recôncavo; 2006 – VIII Bienal do Reconcâvo.

 EXPOSIÇÕES COLETIVAS – Em1996 – Jovens Artistas da Bahia-MAC- São Paulo-SP; Wordwide Print Exibition Portland Art Museum – Oregon-USA ;  1998 – Bahia/ Paris – Galeria Leonardo – Paris – França; 100 Artistas Plásticos da Bahia; Arte Salvador – 450 Anos;  2002 -Pintura Bahia – MAM – Salvador-Ba.  

EXPERIÊNCIA – Atua desde 1995 como professor instrutor de arte educação na Fundação Cidade Mãe. Foi professor substituto da Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia – UFBA.

TRAJETÓRIA – 1. 2004 a 2005 – UFBA-Escola de Belas Artes – Departamento de Desenho e Escultura -Cargo: Prof. Substituto de Desenho I, Gravura I e Il e Técnica e Processo Artístico. 2. 1998 a 2007 – Fundação Cidade Mãe – Cargo: Instrutor da Oficina de Artes Plásticas. 3. 1995 – UFBA- Escola de Belas Artes- Departamento de Desenho e Escultura – Cargo: Prof. Substituto de Desenho I e IV, Gravura I.

CURSO- SEMINÁRIO – E1996 – Curso de Arte e Educação – Museu de Arte da Bahia – Salvador-Ba; Congresso Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas- USP — São Paulo- SP.  2002 – Seminário: As Formas Híbridas da Arte e Suas Relações entre a Escultura a Fotografia MAV- Escola de Belas Artes -UFBA; Curso; História da Fotografia Contemporânea Espanhola – MAV- EBA – UFBA.