Inveja e ideologias que atropelam o mérito 3, Schopenhauer 1

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Por Joaci Góes
(Ao confrade Alfredo Matta!)
Arthur Schopenhauer (1788-1860), filósofo alemão, chefe da escola do pessimismo e dos impulsos irracionais da vida, nascidos da vontade. Schopenhauer tratou a inveja, sobretudo, em duas de suas obras: Os Fundamentos da Moralidade (1841) e Parerga e Paralipomena (1851), associando-a ao personalismo, o desejo compulsivo de existir, essencialmente egocêntrico. Considerava a inveja um sentimento natural do homem, uma característica a ele inerente, razão pela qual não tem como libertar-se dela. Por isso, “embora essencialmente má, a inveja deve ser desculpada”. Para ele “a inveja nasce da inevitável comparação entre nossa situação e a de outros”. Quando esta for melhor que a nossa, instala-se, em nós, um sentimento de inferioridade, se percebermos que a situação do outro lhe acarreta mais felicidade do que a nossa em nós. Considerava “natural o gosto amargo de nossas deficiências diante da prosperidade e alegria dos outros”, porque “os homens são incapazes de suportar a felicidade alheia sem se sentirem miseráveis” (Parerga e Paralipomena). Na visão pessimista de Schopenhauer, a inveja está na base do permanente estado de infelicidade, inerente à condição humana. A polidez seria um instrumento civilizado, mas hipócrita, destinado a escamotear o egoísmo, naturalmente repulsivo. Sem o controle do temor ou do incentivo moral, o homem pratica os atos mais hediondos. A Justiça é, para ele, a virtude que sintetiza o temor e o incentivo moral. Sem ela, a convivência humana degeneraria em conflitos e guerras que conduziriam rapidamente à destruição (Os Fundamentos da Moralidade).

Schopenhauer define a inveja como a geratriz de má vontade, efervescente quando diante da felicidade, riquezas ou sucesso alheios; reconhece sua ubiquidade e vê o ódio como seu aliado permanente. A inveja reforça as paredes entre as pessoas, tornando-se o sentimento antissocial, por excelência. Schopenhauer filiou-se ao pensamento de Hesíodo e Aristóteles, ao reconhecer que a inveja grassa, essencialmente, entre iguais ou quase iguais. Avalia que o tipo mais desagradável de inveja seja a dirigida contra as qualidades pessoais, não apenas porque são intransferíveis como porque mereceriam ser objeto de valorização e reconhecimento, residindo aí um dos principais traços de sua malignidade. “Aqueles que invejam dons naturais ou superioridades pessoais, como a beleza nas mulheres e a inteligência nos homens, não têm consolo nem esperança, restando-lhes, como alternativa, odiar os que os possuem”. Relacionou três modalidades de aristocracia: do berço; da riqueza e do espírito. Cada uma dessas modalidades vive rodeada de grande número de invejosos, amargamente frustrados, por não pertencerem, também, à aristocracia.

E quando esses frustrados reúnem coragem, não perdem ocasião para fazerem ver aos aristocratas que ‘vocês não são melhores do que eu’. Por outro lado, os membros de uma modalidade de aristocracia convivem harmoniosamente e sem inveja com os integrantes das duas outras modalidades”.  Schopenhauer considera o Schadenfreude (felicidade pela desgraça dos outros), o mais condenável dos sentimentos e o oposto tanto da inveja (sofrimento pelo sucesso alheio), quanto da simpatia ou caridade (pesar pelo sofrer alheio). “Invejar é humano; gozar com a infelicidade alheia é diabólico… O egoísmo pode conduzir a crimes e a más ações de todo tipo, mas as dores e prejuízos que causam não são o fim que almejam, são meios que se criam acidentalmente. Por outro lado, a crueldade e o desejo de fazer o mal têm as dores e o sofrimento alheios como fim; e uma vez alcançado este fim, os autores sentem prazer, o que lhes confere um maior poder de perversidade moral. A regra do egoísmo supremo é: Não ajude a ninguém, e, se lhe for conveniente, prejudique. A regra da ruindade é: Cause aos outros o mal que puder. 

Na próxima semana teremos mais de Schopenhauer sobre a inveja.