Luiz Carlos Fontes Alencar: magistratura e magistério

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Por Gilfrancisco
Grande magistrado que abrilhantou o Superior Tribunal de Justiça com a sua vasta cultura jurídica. Ele não só pontificou na magistratura como também no magistério superior e no mundo das letras. Sua morte é uma grande perda.

                                              Paulo Costa Leite

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            Tenho plena consciência de que todo poder emana do povo e em seu nome será exercido. Assim, o Poder Judiciário, como os demais Poderes do Estado, tem por meta final o Bem Comum, que é a própria razão do Estado, criado pelo Homem. E no desempenho da sua missão, deve o Poder Judiciário modernizar-se, desdobrar-se, desconcentrar-se, para que atinja todas as camadas da população. Não pode o Poder Judiciário ser atuante, para que os direitos elementares dos cidadãos tenham pronta resposta, rápida. No momento em que o Estado assumiu o monopólio da prestação jurisdicional, surgiu para os indivíduos no direito de invoca-la. Então, a prestação jurisdicional é um ônus que o Estado assumiu, e o Poder Judiciário, que é o instrumento do Estado para realizar este seu dever, deve instrumentalizar-se adequadamente.

                                                               Luiz Carlos Fontes de Alencar

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Trajetória de Vida

            Filho do poeta e advogado provisionado cearense Clodoaldo de Alencar (1905-1977) que chegou no início da década de vinte em Sergipe, e Eurides Fontes de Alencar, filha do médico José Fontes. Luiz Carlos Fontes de Alencar nasceu na cidade de Estância, Estado de Sergipe, no dia 31 de dezembro de 1933. Tendo estudado no Colégio Serrano, passa residir na cidade de Alagoinhas, no Estado da Bahia, onde frequenta juntamente com seu irmão Clodoaldo de Alencar Filho (1932), o Colégio Salesiano. Retornando a terra natal, conclui o ensino médio no Colégio Estadual de Sergipe em 1953. Luiz Carlos, inicia sua vida profissional em 1952 quando foi nomeado Escrevente Compromissado e suboficial do Registro do Cartório do 11º, do qual saiu para fazer o curso de Direito. Após prestar concurso vestibular para a Faculdade de Direito de Sergipe, permanece por um ano, transferindo-se no anos seguinte, para a cidade do Recife. Bacharelou-se em Ciências Jurídicas e Sociais, em 1958, pela antiga Faculdade de Direito do Recife, desde 1967 incorporada à Universidade Federal de Pernambuco, onde também doutorou-se em 1960.

            Fontes de Alencar iniciou-se na magistratura em 1961, como juiz de direito da Comarca de Tobias Barreto, tendo passado por outras Comarcas até tornar-se desembargador do Tribunal de Justiça de Sergipe, promovido por merecimento, em 1979.

Magistério

Fontes de Alencar, iniciou a carreira no magistério, quando atuava como Promotor Público na Comarca de Itabaiana, foi professor da disciplina de História e Fundamentos Sociais da Educação na Escola Rural Murilo Braga e depois diretor da mesma instituição de ensino. Em 1972, Luiz Carlos Fontes de Alencar é nomeado professor Adjunto do Departamento de Direito da Universidade Federal de Sergipe, lecionando as disciplinas: Direito Penal II, Processo Penal Militar, Processo Penal Especial, Processo Penal I e II e Teoria Geral do Processo, integrando, inclusive, mos Conselhos Universitário (1972) e de Ensino e Pesquisa (1974-1976). Na Universidde Federal de Sergipe foi Vice-Reitor no biênio (1977-1979). Em Brasilia integrou o quadro docente de sua universidade, (1990-1995), lecionando as disciplinas Processo Penal I e II:

Quando já estava na comarca de Maruim, bem próximo de Aracaju, ousei ingressar no magistério superior, na Faculdade de Direito de Sergipe. Poucos dias depois, o Diretor da Faculdade pediu-me um trabalho para a Revista da Instituição e, quando lhe entreguei, disse-me ele: “Deixe aqui que vou ver se está digno da Revista” – o Diretor da Faculdade era o Prof. Gonçalo Rollemberg Leite, irmão da Desembargadora Clara Leite Rezende. Eo estudo foi publicado no nº 13 da Revista da Fsculdade. O meu viver tem duas vertentes: a magistratura e o magistério superior.

Posse ASL

            Tendo tomado posse na Cadeira nº 26 da Academia Sergipana de Letras, em sessão realizada em 20 de dezembro de 1970, Luiz Carlos diz em seu discurso de posse:

            Senhores Acadêmicos:

                Esta noite é verdadeiramente um encontro de gerações. Explico-me: José Olino de Lima Neto, Severino Uchoa, João Evangelista Cajueiro, José Bonifácio Forte Neto, Luiz Pereira de Melo e Manuel Cabral Machado, este último, no curso Jurídico que iniciei aqui na antiga Faculdade de Direito, foram meus professores. A outros que convosco estiveram neste sodalício, igualmente devo a minha formação: José Augusto da Rocha Lima, Gonçalo Rollemberg Leite e Garcia Moreno. Por dever de justiça, um outro nome devo acrescentar a esta lista: o de Luiz de Magalhães. Encontramo-nos em Itabaiana, a Velha Loba, como a chamava Sebrão, sobrinho, ali nascido. Eu, ainda estudante de Direito, promotor público, substituo; ele, lúcido, respeitável e respeitado, honrando a Magistratura Sergipana, era Juiz de Direito. Não foi formalmente meu professor; mas, quanto aprendi com ele! Com Ofenísia Soares Freire e Maria Thétis Nunes, que bem merecem o galardão acadêmico, também estudei. A admiração que quando bem jovem lhes tinha, com o passar do tempo só tem aumentado.

Ingresso no TJS

                Nomeado Desembargador do Tribunal de Justiça de Sergipe, pelo Governo Augusto Franco, em 1979, reproduzimos aqui um trecho do discurso de posse do Desembargador Luiz Carlos Fontes de Alencar, publicado na Revista do Tribunal de Justiça de Sergipe, nº5, páginas 318-321, 1983:

                No instante em que assumo o cargo de Desembargador do Tribunal de Justiça do meu Estado, volto o pensamento para um momento de minha vida, já distante do tempo presente, inícios dos anos quarenta, na comarca de Itabaianinha. Entre inúmeros livros cartorários, a figura de meu pai, Clodoaldo de Alencar.

                No interior do Estado, acolá, a vida era sem ronha e rolava e rodava e rangia rotineiramente, como a roda dom carro de boi na serrana paisagem tranquila. A lentidão comandava as comunicações, que não chegavam ao meu mundo de menino. A meninada não tinha consciência de que o resto do mundo ardia nas chamas da II Grande Guerra. A gurizada – meus irmãos e eu incluídos, sem perceber que esboçava destinos, imitava as audiências de que, como escrivão, meu pai participava. Nem sempre era pacífica a distribuição dos papeis aos participantes (…)

                Eminentes Desembargadores:

                Vossas Excelências concederam-me o destaque, assaz honroso, de figurar, na companhia de nobres colegas, de listas tríplices para promoção, por merecimento, ao cargo de Desembargador. Indissimulável o meu contentamento com a honraria, que lhes agradeço ex-corde. A cada vez, porém, a inclusão do meu nome a recebi com a humildade de quem tem apenas a vontade de acertar e o desejo de bem servir à terra natal. De par com os meus agradecimentos, recolham Vossa Excelências a certeza do meu contributo ao empenho desta Corte na grandeza constante da justiça sergipana.

Presidente do TJS (1985-1986)

                Eleito durante sessão realizada em dezembro de 1984, o Desembargador Luiz Carlos Fontes de Alencar assumiu a Presidência do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe em fevereiro de 1985, tinha como vice-presidente o Desembargador José Nolasco de Carvalho (1927) e como Corregedor Geral da Justiça o Desembargador Aloisio de Abreu Lima (1931).  Vejamos trecho do discurso publicado na Revista do Tribunal da Justiça de Sergipe, nº7, páginas 245-247, 1985.

            Senhores, é sumamente honroso para um Magistrado assumir a Presidência do Tribunal que integra. É indisfarçável, mesmo, a sua emoção no ato em que assume a chefia do Poder; mas, devo afirmar neste instante, que tenha plena consciência de que todo poder emana do povo e em seu nome será exercido. Assim, o Poder Judiciário, como os demais Poderes do Estado, tem por meta final o Bem Comum, que é a própria razão do Estado, criado pelo Homem.

                E no desempenho da sua missão, deve o Poder Judiciário modernizar-se desdobrar-se, desconcentrar-se, para que atinja todas as camadas da população. Não pode o Poder Judiciário ter uma postura ornamental face a comunidade. Deve o Poder Judiciário ser atuante, para que os direitos elementares dos cidadãos tenham pronta resposta, rápida proteção. No momento em que o Estado assumiu o monopólio da prestação jurisdicional, surgiu para os indivíduos o direito de invoca-la. Então, a prestação jurisdicional é um ônus que o Estado assumiu, e o Poder Judiciário, que é o instrumento do Estado para realizar este seu dever, deve instrumentalizar-se adequadamente.

Ministro do STJ

                O Superior Tribunal de Justiça – STJ, criado pela última Constituição, de 1988, empossou sete novos ministros que passaram a integrar a Corte de 33 ministros. São eles: os (ex) desembargadores Luiz Vicente Cernicchiaco, Luiz Carlos Fontes de Alencar, Sávio de Figueiredo Teixeira, Waldemar Zveiter, Francisco Claudio Santos, Raphael de Barros Monteiro e Athos Gusmão Carneiro. O Correio Braziliense do dia 19 de maio de 1989, informa sobre a recepção:

            A solenidade foi presidida pelo ministro Evandro Gueiros Leite presidente do STJ e teve a presença dos ministros Antônio Carlos Magalhães, das Comunicações, Oscar Dias Corrêa, da Justiça, Ivan de Souza Mendes, do SNI, João Alves, do Interior, além da cúpula do Poder Judiciário. Participaram, também, os governadores Joaquim Roriz, do Distrito Federal, Moreira Franco, do Rio de Janeiro, e Antônio Carlos Valadares, de Sergipe.

                Os novos ministros foram escolhidos entre desembargadores de todo o país pelo Superior Tribunal de Justiça, que enviou ao Palácio do Planalto uma lista de oito nomes, em abril. O presidente Sarney escolheu os sete desembargadores, que foram aprovados pelo Senado.

                Nessa condição foi membro da Comissão de Jurisprudência do STJ e Presidente da Quarta Turma do mesmo Tribunal (1993), além de integrar o Conselho de Justiça Federal e haver exercido a função de Coordenador-Geral da Justiça Federal.

Academia Brasileira de Letras

                Acadêmico, Cadeira nº35, cujo patrono é Coelho Neto (1864-1934), em sucessão ao acadêmico baiano Herberto Salles (1917-1999). Trecho do discurso de posse (17 de outubro de 2001), in Orações Acadêmicas, Fontes de Alencar/Carlos Fernando Mathias de Souza. Brasília, Ed. E Gráfica Criativa, 2001:

                Na banda do mar nasci, em Sergipe, na cidade de Estância, outrora Vila Cobstitucional da Estância, berço da Imprensa na Província.

                Acolá abracei a Magistratura e o Magistério. Sempre trabalhei pensando em Sergipe e buscando servir a sua gente – a minha gente. Fiz o quanto Deus me permitiu. Condadosos ventos trouxeram-me ao Planalto Central.

                Ilma, a esposa amada, mompanheira e amiga, sempre ânimo e arrimo. Quatro os filhos queridos: Luiz Carlos, Gisela e Moema já têm assentados aqui os respectivos núcleos familiais; Daniela, juventude e candura, azulece os nossos dias outoniços. Entregamo-nos todos, por inteiro, ao cromatismo do céu de Brasília, ao seu encantado por-do-sol – róseo-rubro entardecer, argênteo ocaso ou aurirrútilo crepuscular. Apreciamos as flores e chapadas; alcantis, vales e morrarias deste rechão mágico.

                E o mar, com sua ondeada?  A modernidade absorveu a distância do altoplano à praia, e o canto undissono é audível em La Mer, de Claude Debussy.

                Mas se alguém disser que a sugestão dos vai-e-vens marinhos do poema sinfônico de Debussy foi inspirada nas ondas da Normandia, lá perto de Saint-German-en-Laye, monde nasceu o compositor de Pelléas et Mélisande, e não nas do meu Nordeste, eu direi que me não perturba a indagação de Pablo Neruda ao oceano, no verso que Paulo Mendes Campos traduziu:

                                               “…………………onde

                                          está a tua origem?”

Publicações

                Luiz Carlos Fontes de Alencar, deixou várias colaborações em jornais, separatas e revistas do país: Revista de Aracaju (1955), Revista da Faculdade de Direito de Sergipe (1970), Revista da Academia Sergipana de Letras (1981), Revista do Conselho Estadual de Justiça (1999), Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo (2000), Revista de Direito Renovar (2000, 2001 e 2003), Jornal de Letras (2001). Fontes de Alencar tem publicado prefácios, ensaios, crítica literária em livros de terceiros, além de publicar seus próprios livros: O Pau-Brasil na história nacional, Bernardino José de Souza, Edição fac-similar, pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (1999), Liberdade: teoria e letras (2000), História de uma polêmica (2005), Princípio de Independência e Harmonia entre os Poderes e suas Realidades e Tendências (monografia apresentada no final do curso na Escola Superior de Guerra, 1980).

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                Este trabalho de investigação reclama conhecimento do conteúdo geral da obra de Rui, já se aproximando de 140 tomos. Descobrir nessa massa de informações o ponto apropriado ou procurado é empenho de pesquisador experiente e culto, em busca do diamante sem jaça. Conhecimento dessa natureza revela o Ministro Fontes de Alencar, do Superior Tribunal de Justiça, no conjunto de apreciações que reuniu sobre o habeas corpus e outros estudos. Além de demonstrar saber da vida de Rui, no Império e na República, penetra-lhe o pensamento para fazer dele ressaltar conceitos primorosos, pouco divulgados […]. De ser assinalado, também, o cuidado no estilo, numa travessia histórica em que a língua portuguesa não vem merecendo om justo respeito.

                                                       Josaphat Marinho – História de uma polêmica

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Morte

                O ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça e ex-professor da Universidade Federal de Sergipe, Luiz Carlos Fontes de Alencar, faleceu em 2 de julho de 2016, aos 82 anos. Ele entrou para o STJ em 1989 e se aposentou em dezembro de  2003, havia passado por uma cirurgia abdominal e faleceu em decorrência de complicações após a operação. Era casado com Ilma Santos de Alencar e deixou quatro filhos: Luiz Carlos, Gisela, Moema e Daniela Santos de Alencar.
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GILFRANCISCO é jornalista, escritor, Doutor Honoris Causa concedido pela UFS. Membro do Grupo Plena/CNPq/UFS e do CPCIR/CNPq/UFS gilfrancisco.santos@gmail.com