Osman Hora Fontes e seu centenário

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Por Gilfrancisco
Como forma de rememorar esse ilustre personagem da advocacia sergipana, Ministério Público Federal, Universidade Federal de Sergipe, Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Sergipe e Academia Sergipana de Letras Jurídicas, com o apoio do Tribunal de Contas do Estado -TCE, prepararam uma cerimônia de homenagem póstuma, que contou com apresentação de um documentário, doação da Biblioteca do professor ao MPF/SE e exposição do seu gabinete de trabalho e fotografias.

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            Osman Hora Fontes, nasceu em 3 de outubro de 1916, na cidade de Riacho do Dantas, considerada por ele “cidade presépio”, filho de Gaspar Fontes e Mirena Dantas Horas Fontes, familiares tradicionais da cidade, seu pai, sócio da firma Fontes Irmãos e Cia. Em Aracaju, estudou no Colégio Tobias Barreto, dirigido pelo professor Zezinho Cardoso e aos 16 anos concluiu os estudos secundários no Atheneu Pedro II. Seguindo para o Rio de Janeiro, onde ingressou na Faculdade de Medicina. Após frequentar o curso durante um ano, decidiu abandonar os estudos médicos para tentar nova carreira e em 1935, matriculou-se na Faculdade Nacional de Direito. Na capital federal, Osman reside inicialmente com seu tio Lourival Fontes (1899-1967), jornalista, político sergipano próximo a Getúlio Vargas, nomeado em 1934, diretor do Departamento de Propaganda e Difusão Cultural, depois Departamento de Imprensa e Propaganda – DIP.

            É na Faculdade de Direito onde Osman Hora Fontes, recebe a formação socialista dos professores Leônidas de Rezende, filósofo e jornalista (1889-1950), autor de A Formação do Capital e seu desenvolvimento, Edições do Senado Federal, 2011 e do baiano Hermes Lima (1902-1978), com uma vasta obra literária publicada e um dos fundadores do Partido Socialista Brasileiro. Assim vivia na capital federal Osman, entre a esquerda marxista, dos professores e a direita Getulista, do seu tio Lourival Fontes.

            Seu amigo Manuel Cabral Machado (1916-2009) que juntos formaram a equipe dos fundadores da Faculdade de Direito, revela que Osman era talentoso e ético, um homem de muita personalidade. Sobre o jurista escreveu o artigo Osman Hora Fontes, jurista talentoso e ético, incluído do livro Brava Gente Sergipana e outros Bravos, organizado por Marcos Cardoso, Edise/TCE/SE, 2016.

Faculdade Nacional de Direito

            Fundada em 1920, através da fusão de duas importantes instituições de ensino criadas no século XIX, em 1937 foi transformada na Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil, considerada uma das mais tradicionais e conceituadas escolas de Direito do Brasil, formou grandes juristas, diplomatas, escritores, jornalistas, políticos, juízes e desembargadores.

            Em 1967, o governo militar alterou sua denominação para a atual, embora ainda seja possível utilizar a denominação Faculdade Nacional de Direito. No dia 11 de agosto de 2017, a Faculdade Nacional de Direito ao realizar um ato em defesa do Estado de Direito passa a ser a primeira faculdade do país a receber dois ex-chefes de Estado: Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Vana Rousseff.       

Faculdade de Direito de Sergipe

            Ao retornar a Aracaju, já bacharelado (colação de grau em 16 de dezembro de 1939) em ciências jurídicas, foi aprovado em concurso público para atuar como juiz na cidade de São Cristóvão (30.03 a 12.12) de 1940. Um ano mais tarde, optou por trabalhar como advogado nas causas operárias. Nesse mesmo ano, o Diário de Notícias, do Rio de Janeiro, edição de 8 de novembro:

            O interventor federal interino, dr. Leite Neto, assinou ontem os seguintes decretos: Concedendo a reversão requerida pelo juiz de direito, bacharel Otavio de Sousa Leite, e nomeando o advogado Osman Hora Fontes para membro do Conselho Penitenciária do Estado.

                E no dia seguinte, nesse mesmo periódico era publicado o seguinte texto:

            O interventor federal assinou decretos nomeando o senhor Mario Araújo Cabral, advogado do município de Aracaju; o Sr. Osman Hora Fontes, advogado do Departamento das Municipalidades e o sr. Onesino Araújo Pinto, diretor da extinta Secretaria da Fazenda, para, em comissão elaborarem um anteprojeto do Estatuto dos funcionários desta capital.

Pela sua vivência como advogado, Osman chegou a presidir a seccional da Ordem dos Advogados do Brasil em Sergipe. Em 1943 é o ano em que foi criado em Aracaju, um curso de Administração e finanças, que funcionava anexo, a Escola de Comércio Conselheiro Orlando. Tinha como propósito formar administradores para gerenciar as finanças do Estado e da iniciativa privada, e assim suprir as carências de um Estado em desenvolvimento. Nessa escola, Osman leciona a disciplina Direito Operário.

Em 18 de novembro de 1944, Osman casa-se com Maria Carolina Sobral Menezes, tendo como cunhada, dona Ivone Menezes, mãe do poeta Mário Jorge (1946-1973) e Ana Lúcia, por não terem filhos, adotou a sobrinha.

Chefe de Polícia

 Convidado pelo interventor federal Augusto Maynard Gomes para ser chefe de polícia (07 de julho, 1944 a 1945), cargo equivalente a Secretário de Segurança Pública, Osmar permaneceu por um período de 1 ano na função, retornando a advogar e logo assume a Direção do Departamento de Municipalidades. Vejamos o registro do Sergipe-jornal, de 10, julho de 1944:

                                               Novo chefe de Polícia

                Assumiu as funções de Chefe de Polícia do Estado o bacharel Osman Hora Fontes, que vinha exercendo, em comissão, o cargo de Delegado Auxiliar da Capital. O novo titular da Diretoria de Segurança Pública, advogado nos auditórios do Estado, leva para a função em que vem de se empossar, credenciais bastantes que o recomendam ao conceito público.

            Para registrar essa nomeação, os amigos de Osman, ofereceram-lhe um almoço no Hotel Marozi, onde foi construído o atual edifício Cidade de Aracaju. O escritor e professor da UFS, Jorge de Oliveira Neto, saúda o amigo com algumas palavras, registrada por Juçara Fernandes Leal de Mello no artigo “Lembrando Dr. Osman Hora Fontes”, publicado no Caderno de Cultura do Estudante – UFS, 1994.        

            A distinção que lhe foi conferida nos dá um orgulho imenso, pois, para tal cargo, a escolha de um moço de 27 anos representa o reconhecimento de que aos moços deve ser entregue a direção do barco, já que os velhos métodos de navegação fracassaram e só eles conhecem os novos métodos e o rumo certo para levá-lo ao destino certo.

Solenidade

            Outra contribuição importante de Osman Hora Fontes, foi sua participação movimento de fundação da Faculdade de Direito de Sergipe, sob a liderança do Dr. Gonçalo Rollemberg Leite, durante o governo e o apoio de José Rollemberg Leite (1912-1996), sendo um dos que redigiram os estatutos da Faculdade, em 20 de julho de 1950, conforme publicação no Diário Oficial do Estado, conforme Ata de instalação da Faculdade de Direito de Sergipe, datada de 18 de outubro, registrada pelo Secretário, Severino Pessoa Uchôa. Após criação da Faculdade de Direito, Osman Hora Fontes passou a ser um dos professores catedráticos e se destacou lecionando as disciplinas Direito Penal e de Direito Penitenciário.

No dia 15 de março as 20 hs. de 1951, no Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, teve lugar a solenidade da inauguração das aulas da Faculdade de Direito de Sergipe. Presidindo da mesa de trabalho o exmo. Sr. Dr. Enoch M. Santiago, presentes o exmo. Sr. Governador do Estado e o Exmo. Sr. Bispo Diocesano e diversas outras pessoas. O exmo. Sr. Diretor da Faculdade de Direito de Sergipe Dr. Otavio Leite, abriu os trabalhos da noite, passando logo a palavra ao Dr. Gonçalo Rollemberg Leite, encarregado pelo Conselho Técnico Administrativo da Faculdade de Direito de Sergipe de pronunciar a aula inaugural. E a oração proferida pelo ilustre da novel instituição de ensino superior foi realmente digna de um mestre magistral.

Desenrolando aos olhos dos ouvintes a gênese da Faculdade de Direito de Sergipe, desde os anseios remotos dos idealistas do Direito, que não puderam ver, ao seu tempo, realizadas as suas aspirações nobilitantes. Encerrando fez um apelo aos novos estudantes de Direito, no sentido de que fossem eles dignos das tradições jurídicas de Sergipe, cujas jurisconsultos têm pontificado em outros meios mais amplos que o nosso.

Fundação Laureano

Em 17 de março de 1951 foi criada a Fundação Napoleão Laureano, instituição filantrópica com personalidade jurídica de direito privado, sem fins lucrativos. Em Sergipe foi instalada uma sucursal, tendo como diretor presidente Valter Cardoso e Osmar Fontes com vice-presidente.

Procurador da República

Nomeado em 4 de junho de 1947 pelo Presidente da República, Procurador da República de 3ª categoria interino e depois por outras vezes, até sua nomeação como titular em 4 de setembro de 1956, aos quarenta anos de idade, permanecendo por 37 anos, até sua aposentadoria em 8 de fevereiro de 1984. Em 1969 os Ministros Militares no exercício temporário da Presidência da República assinaram decreto nomeando Osman Hora Fontes para como representante do Governo do Estado de Sergipe, exercer por seis anos, o mandato de membro do conselho diretor da Fundação universitária de Sergipe, vago em virtude do término do mandato do professor Carlos Alberto de Barros Sampaio.

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Centenário do primeiro procurador da República em Sergipe,

                                  Osman Hora Fontes

Medalha do Mérito Parlamentar

            No decorrer das homenagens do centenário do magistrado (2016), Assembleia Legislativa de Sergipe homenageou o jurista com a Medalha do Mérito Parlamentar, maior honraria do Poder Legislativo Estadual. Ao lado de familiares, amigos, diversos magistrados, representantes de movimentos sociais e sindicais e representantes dos três poderes. A deputada estadual Ana Lucia (PT), filha do homenageado, acompanhou a solenidade.

Presença da OAB/SE

            O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Sergipe – OAB/SE, Henri Clay Andrade, participou do Ato de homenagem ao ex-presidente da Ordem, Osman Fontes. Segundo Clay:

            Osman Hora foi um homem de letras jurídicas, com uma retidão de caráter e um compromisso cívico que deixou um legado de referencia por gerações. Como ex-presidente da OAB, dignificou a advocacia de Sergipe e honrou as tradições da Ordem dos Advogados do Brasil. Tudo o que fez, realizou com muita competência e dignidade.

                Para o presidente do Tribunal de Contas do Estado, conselheiro Clóvis Barbosa de Melo, Osman Hora:

            Tem uma história muito bonita no Estado. Ele prestou relevantes serviços à sociedade sergipana. A sua presença faz muita falta. A sua dignidade e sua probidade, que ele sempre representou em nossa sociedade, fazem muita falta nos dias de hoje.

Agradecimentos

            Em sua fala, Ana Lúcia destacou o caráter humanista e a retidão ética de Osman Hora, para ele a justiça tinha que estar acima do direito:

            Neste momento tão difícil d nação brasileira, espero possamos despertar em cada um de nós aquilo que é tão importante – que a justiça, que a igualdade supere o direito e as interpretações equivocadas do direito, finaliza a deputada.

                A palavra foi franqueada a neta de Osman, Mônica Carlos Vieira Menezes Góes, que agradeceu em nome da família:

            Em todas as homenagens até agora, foi mostrado quem era o homem público, o intelectual, o professor, o procurador d república apaixonado pelo que fazia. Mas destaco acima de tudo, o superpai, o super avô, o super tio. Em nome de toda a minha família, minha mãe, meus irmãos, minhas tias, meus primos, agradeço à Casa pela tamanha honraria.

                Sobre o ilustre sergipano, o governador Jackson Barreto afirmou que Osman Hora Fontes é de família de grandes juristas:

            Um homem de uma inteligência, de uma formação jurídica muito elevada e que teve uma participação efetiva ao lado dos democratas pela redemocratização do país. Durante o golpe de 64, marcou sua presença na Faculdade de Direito como um grande mestre, como um grande professor muito querido dos alunos. Era uma espécie de ombro amigo, um conselheiro, um homem bom de formação socialista. Um homem venerável e venerado, respeitado por toda sociedade. Um democrata aliado da nossa causa, mas sem ser um radical.

                A presidente da Academia Sergipana de Letras Jurídicas, Adélia Pessoa, também agradeceu a homenagem prestada pela ALESE ao patrono da cadeira 25, e acrescentou:

            Que esta medalha representa o registro imorredouro da atuação deste grande sergipano, Osman Hora Fontes, que soube semear em terreno fértil, apontando caminhos áticos na busca da dignidade de todos as pessoas.

Lançamento

            Osman Hora Fontes nos deixou um único livro, intitulado Quatro Encontros com a Mocidade, publicado pelo Centro Gráfico do Senado Federal – em 1981, onde estão reunidas aulas inaugurais e quatro orações de paraninfo dirigidas a formandos da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Sergipe, prefaciada pelo professor João Costa. As orações foram proferidas sempre no dia 8 de dezembro, nos anos de 1956, 1967, 1969 e 1970. Durante as comemorações do seu centenário, em 2016, foi lançada uma 2ª edição, com apresentação de Adélia Moreira Passos, além do texto do desembargador do TRT da 3ª Região, Paulo Guedes, membro da Academia Sergipana de Letras Jurídicas.

            Além do reconhecimento de excelente professor, Osman Hora Fontes foi escolhido pelos alunos formandos, paraninfo por quatro vezes. E mais, Osman foi homenageado no quadro/placa de formatura dos acadêmicos das Turmas de 1955, 1957, 1964, 1965, 1966 e recebeu o Preito de Gratidão da Turma de 1962.   

Doação da Biblioteca

Na ocasião foi oficializada a doação da Biblioteca de Osman Fontes, com cerca de onze mil volumes, de variados assuntos, para o acervo do Ministério Público Federal. Graças a parceria entre a UFS e MPF/SE, teve inicio o tratamento do acervo do Dr. Osman Hora. Estive por várias vezes em sua residência, à Praça Tobias Barreto, juntamente com a deputada Ana Lúcia e sua filha Mônica, analisando a Biblioteca, acompanhado pelo fotógrafo Cleverton Ribeiro, para montarmos provisoriamente o seu gabinete na abertura da exposição, realizada na sede do Tribunal de Contas do Estado-TCE.

Morte

            Osman Hora Fontes faleceu em 28 de maio de 1992, as 18,10 horas em Aracaju, depois de longa e dolorosa enfermidade. Acometido de uma insuficiência renal crônica, era fumante por mais de 40 anos, teve insuficiência cardíaca e pulmonar, o que agravou o seu quadro clínico (edemas pulmonares). O féretro saiu as 10:00 horas da sua residência, Praça Tobias Barreto, 194, para o cemitério Santa Izabel.

            Durante as pesquisas não foi localizado nenhum artigo publicado na imprensa assinado por Osman Hora, nem mesmo a oração proferida em 23 de outubro de 1937 no Centro Sergipano do Rio de Janeiro. E sim, registro nos jornais: O Jornal do Comércio de 16 de outubro e no Diário de Notícias, de 22 de outubro, registrando mais uma atividade do Centro Sergipano, pela passagem do 117 aniversário da emancipação política de Sergipe. Na programação (I Parte), Discurso do bacharel Osman Hora Fontes, sobre o saudoso escritor Clodomir de Souza e Silva.

BOX

Dr. Osman, um homem culto, rigoroso e simples, cumpria quase todos os dias a pé, indo e vindo, o trajeto relativamente longo da sua casa na Praça Tobias Barreto até o local de trabalho. E mantinha rigorosamente em dia os processos que despachava.

                                    Luiz Eduardo Costa (jornalista)

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Jornalista, escritor, Doutor Honoris Causa concedido pela UFS. Membro do Grupo Plena/CNPq/UFS e do CPCIR/CNPq/UFS. gilfrancisco.santos@gmail.com