Recados de Otto, cautela de Loyola e o jogo afiado de 2026

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Por Victor Pinto

Por trás do tom sereno e do verbo sempre ponderado, o senador Otto Alencar (PSD) mandou recados claros ao PT durante entrevista ao programa Boa Tarde Bahia, da Band Bahia. Na entrevista que concedeu a mim e a Luís Filipe Veloso, sem perder o estilo diplomático, Otto fez o que lhe é característico: colocou o dedo na ferida sem parecer que apertava, como médico de formação também. A referência à chapa “puro sangue” — composta exclusivamente por petistas — reacendeu o debate sobre a costura da aliança governista para 2026 e expôs, ainda que com polidez, o incômodo crescente com os rumos que o grupo político vem desenhando.

Otto, como voz experiente do Senado e pilar do PSD baiano, fez questão de lembrar que, na última vez que o carlismo, após anos de poder, tentou a chapa puro sangue não surtiu efeito. A referência à eleição de 2006, quando a chapa “puro sangue” não vingou, não é gratuita. É um aviso embalado em história: repetir o erro pode custar caro. Ainda que sem mencionar nomes ou bater de frente como fez o também senador Ângelo Coronel recentemente, Otto plantou um alerta político estratégico — o recado foi dado.

Enquanto isso, o governo do Estado, por meio do secretário de Relações Institucionais, Adolpho Loyola, tentou suavizar o estrago. Em entrevista ao mesmo Boa Tarde Bahia da Band, Loyola minimizou os efeitos da fala de Otto, classificando tudo como parte “natural” do debate interno. O tom de panos quentes adotado por Loyola é compreensível: cabe a ele manter a base colada com fita adesiva se for preciso, mesmo quando os discursos destoam. Sua missão é evitar rupturas que prejudiquem o arranjo político de Jerônimo Rodrigues, que precisa navegar com estabilidade até o pleito de 2026.

No entanto, fora da órbita petista, ACM Neto resolveu não deixar o tema esfriar. Em entrevista à Rádio Excelsior, na mesma semana, o ex-prefeito de Salvador e líder da oposição chamou de “arrogância” a tentativa de construção de uma chapa exclusivamente do PT. Foi além: disse que prefere disputar contra uma chapa puro sangue. A fala é mais do que uma provocação — é uma aposta de que um projeto petista sem o PSD na equação abriria margem para crescimento da oposição em segmentos do eleitorado que já demonstram cansaço do domínio petista.

A movimentação atual revela um embate de estratégias e egos. Otto joga no campo da articulação sutil, Coronel na zona da fricção direta, enquanto o governo tenta manter o equilíbrio, ainda que em cima de corda bamba. De um lado, cresce a tese de que o PT quer uma chapa formada por Jerônimo, Wagner e, agora, Rui Costa ao Senado. De outro, o PSD, maior partido aliado, não aceita papel secundário — nem como coadjuvante, muito menos como figurante.

Se o governador Jerônimo Rodrigues não conduzir esse processo com habilidade, poderá transformar uma vantagem política sólida em um campo de batalha interno. Por ora, a calmaria do discurso de Otto parece mais um alerta do que um recado de rompimento. Mas os próximos movimentos mostrarão se o PT entendeu o recado ou se a teimosia prevalecerá.

Como em todo enredo da política baiana, a música pode até ser suave, mas a letra costuma ser afiada. E o PSD, ao que parece, não vai cantar fora do tom.