Por Marcelo Pockye
Confesso que, à princípio, titubeei sobre a possibilidade de sair de casa para assistir a um show musical de ‘despedida’ (tá……) de um senhor de 82 anos.
Essa bobeada – e aí segue uma boa desculpa -, pode ser creditada também a minha recente inclusão no clube dos idosos. Sim, me tornei sex no último outubro.
Essa confissão ‘pega muito mal’ para uma pessoa completamente apaixonada por música, mas o fato de não querer mais frequentar lugares cheios de gente, enfrentar possíveis chateações ajudou na minha balançada inicial. Um show num estádio de futebol…..
Bem……eu já tinha ido assistir a um senhor inglês – de, na época, 77 anos – dar um espetáculo de 3 horas nesse mesmo estádio anos atrás. Depois, fui vê-lo em São Paulo e também era num estádio de futebol. Mas eu não era sex………
‘Vamos acabar com essa frescura?’ Bora.
O show estava programado para começar às 20:00. Pegamos o Uber 17:30, uma vez que a minha sogra com idade semelhante a do senhor cantante estava na nossa pequena comitiva.
Passada a breve confusão (normalíssima) inicial sobre encontrar portão, setor e lado certos, nos acomodamos.
Quero aqui começar a nomear e prestar uma insignificante (por entender a minha importância)
homenagem à Fonte Nova. Sim, FONTE NOVA. Esse estádio sempre será lembrado e chamado pelo seu verdadeiro nome. Podem vender os direitos de nome a quem quer que seja, podem tentar comercializar uma tradição, mas saibam: o povo não é besta e não se rende – muito menos se vende – a qualquer tentativa de quebrar um costume já arraigado.
Não nasci na Bahia, mas estou pouco me lixando para quem pensa o contrário sobre isso.
A Fonte Nova, nesse dia, estava um brinco. Consegui comer espetinhos com o espeto (por razões óbvias) arredondado, passei pelo posto de hidratação, fui a um banheiro extremamente limpo. Eu, acostumado a frequentar o sanitário do antigo Maracanã com 2 dedos de xixi no chão, simplesmente me vi embasbacado. Me deparei com funcionários educados e solícitos.
O DJ nos presenteou com relíquias do soul/funk nacionais. Puxa, quanta diferença do que se toca por aí………
Aqui, de memória, me lembro de ouvir o antigo Jorge Ben (sim, antes de virar Benjor), Tim Maia, Cassiano…
Num determinado momento, esperando em frente ao nosso setor minha esposa voltar do bar, me peguei cantando e, ridiculamente, dançando sem tirar os pés do chão – balançando minha sensual cintura de quibe -, a maravilhosa ‘As Dores do Mundo’, na versão original do Hyldon.
Com um certo atraso, as luzes se apagam, a galera se agita. No telão, lindos e emocionantes depoimentos. De repente, uma monstruosidade sonora é iniciada. Eu, apesar de estático (característica minha, desde sempre, em espetáculos musicais) não consigo segurar minhas mãos e dedos levado pela ânsia de querer participar da base da bateria e da percussão diante daquele ataque sonoro e começo a batucar/tamborilar nas minhas pernas e na minha cadeira. O arrepio, em determinado momento, é inevitável.
Já no meio da primeira música, meus olhos dão uma leve molhada nas lentes dos meus quase inúteis óculos. Sex e babão, o recém idoso.
Citar sucessos desse senhor é correr o risco de esquecer algumas das suas preciosidades. Ele, como esperado, desfila vários durante a apresentação. Pop, reggae, forró, rock, tudo perfeitamente trabalhado e entregue, para usar uma expressão atual.
Sua indescritível banda tem: um filho na bateria, outro filho no baixo, um neto na guitarra (esses 2 revezavam nesses instrumentos), uma filha no vocal (também no vocal, uma nora), três músicos no naipe de sopro, um tecladista, dois percussionistas, um sanfoneiro, mais um quarteto de cordas. A pergunta que dá um pulo na cabeça: como deve ser passar um tempo na casa dessa família a vendo tocar, cantar, ensaiar, compor, brincar de fazer música?
Esse senhor, em dado momento, falou: ‘não quero mais fazer turnês grandes’. Ou seja, ele vai continuar a fazer shows!!! Glória, irmãos!
Vamos dar nome aos gênios?
Gilberto Gil, anjo, você é uma força da natureza. Sua música é puro sonho. Obrigado.
Paul Mc Cartney também me fez de estátua, duas vezes, mas isso é outra história.
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Escritor, DJ e advogado