Por Gaudêncio Torquato
O Brasil está à procura de um herói. Mas o herói buscado não é aquele capaz de operar milagres, um São Jorge de espadas em punho, pronto para eliminar os dragões da maldade. No passado, quem assumiu esse papel chegou à presidência da República, mas acabou tragado pelo tufão social, que o levou ao impeachment, em meio a uma enxurrada de denúncias e escândalos amplamente divulgados pela mídia.
De lá para cá, a sociedade passou por um “banho ético”. Vacinou-se contra ilusões e passou a desconfiar de figuras messiânicas. O herói que hoje se procura precisa ter uma face humana, moldada por valores como honestidade, ética, autoridade, respeito, coragem, despojamento e simplicidade.
Mas há alguém com esse perfil? Quem se arrisca a apontar um nome? Nossa galeria de heróis é uma parede vazia. O atual dirigente do país já não recebe os aplausos das massas como antes. Os pastores nas igrejas não conseguem mais empolgar multidões. Os fiéis estão atentos aos golpes demagógicos. No futebol, as decepções se acumulam. A seleção brasileira já não encanta como outrora. Neymar perdeu seu brilho, ainda que continue na rota do dinheiro. Os esportes foram mercantilizados, e as disputas agora são movidas pela força do capital. O glamour que outrora iluminava os palcos e estádios está se esvaindo, sufocando nossas emoções. O toque de novidade vem das seleções femininas, que começam a ganhar espaço.
Aqueles que merecem aplausos unânimes já descansam na memória nacional. Ayrton Senna foi um dos nossos heróis. Pelé nos deu adeus. A lembrança evoca ainda outros: Tancredo Neves, que nem teve tempo de transformar sua imagem em fulgor, mas recebeu o pranto nacional. Juscelino Kubitschek ergueu nossa bandeira de progresso. E quem mais? Vultos da história mais antiga. A geração atual não exibe estrelas de brilho semelhante.
Arraes, Brizola, Covas, Itamar, Sarney, Fernando Henrique… cada um deixou sua marca, mas todos foram nivelados pela mesmice. Suas maiores qualidades acabaram obscurecidas pelo processo de autodestruição mútua que caracteriza a política nacional.
O que se vê nas telas de TV é um desfile da dissonância nacional. Quem chama a atenção hoje? Uma figura polêmica, uma estrela passageira como Pablo Marçal, cujo brilho será curto. Aos nossos olhos, ele surge como uma figura excêntrica, com discurso extravagante. A demagogia predomina, com promessas mirabolantes e qualidades fabricadas, acompanhadas por cenários e propostas irreais. Construir um prédio de 1 km como atração turística? É o cúmulo da aberração. A política transformou-se em um grande comércio, onde boas e más intenções se misturam, e os oportunistas proliferam.
Partidos outrora pequenos tornaram-se gigantes, mas sem identidade ou doutrina clara. A política no Brasil virou um grande balcão de negócios, onde atores se revezam em busca de favores e trocas. Quantos, entre os milhares de candidatos a vereador e prefeito neste ano, possuem verdadeira vocação para o serviço público? Quantos são movidos por ideais cívicos? E os prefeitos que tentam a reeleição: ficaram mais pobres ou mais ricos?
Surgirão novos líderes dessa safra? Temos motivos para acreditar na melhora dos padrões políticos? A sociedade está mais crítica e racional. Os eleitores acompanham o desfile de candidatos com mais atenção. Nos recantos mais distantes, a “vacina ética” começa a surtir efeito. Sabemos que malas de dinheiro ainda compram votos, mas já não com a mesma força de antes. Há eleitores que aceitam o dinheiro, mas votam em outro candidato. O voto de consciência está ganhando espaço, provocando ondas de mudança por todo o país.
Se ainda não encontrou, o eleitor tem poucas semanas para achar o seu herói. Não precisa esperar alguém com a aura de um santo. Basta observar os perfis, analisar o passado dos candidatos, examinar suas propostas, compará-los e escolher aquele que mais se alinha ao ideal em que acredita. Mas cuidado para não comprar gato por lebre: há muitos lobos disfarçados de cordeiros e muitos canalhas vendendo terrenos no céu.