Por Victor Pinto
A Assembleia Legislativa da Bahia voltou a cumprir um papel familiar: o de revelar, nas entrelinhas, o real peso político de cada movimento. A comparação entre o tratamento dado à indicação de Otto Alencar Filho (PSD) e o burburinho ao recém-indicado Josias Gomes (PT) para o Tribunal de Contas do Estado escancara isso. Embora ambos sejam indicações do governador Jerônimo Rodrigues, o percurso de cada um dentro da Casa não poderia ser mais diferente.
Otto Filho atravessou a ALBA quase em linha reta. Sabatina tranquila, apoio unânime na Comissão de Constituição e Justiça, ambiente pacificado que descambará no plenário e nenhuma resistência relevante da oposição. Segue uma travessia sem solavancos, que traduz o capital político do PSD, o peso do senador Otto Alencar e a capacidade do partido de construir consensos. A mensagem direta: não valia a pena comprar essa briga.
Já Josias Gomes chega ao mesmo destino por um caminho muito mais tortuoso. Embora respaldado juridicamente pelo STF e amparado por uma mudança constitucional feita sob medida, o deputado federal do PT enfrenta resistência aberta da oposição e, talvez mais incômoda, desconfiança dentro da própria base governista, conforme conversei com algumas fontes nos últimos dias. O discurso nos bastidores é conhecido: voto custa caro, e a sabatina virou moeda. A ALBA, dessa vez, resolveu mostrar os dentes.
A diferença de tratamento não é casual. Ela reflete o lugar que cada partido ocupa hoje no tabuleiro. O PSD atua com autonomia, segurança e musculatura política, mesmo sendo aliado do governo. O PT, apesar de comandar o Executivo, ainda enfrenta ruídos internos, disputas por espaço e uma base parlamentar que não tá afim de responder no automático. A oposição percebe isso e age com precisão cirúrgica.
Há também um elemento estratégico, central: nem Otto Filho nem Josias Gomes estarão na eleição de 2026. A ida dos dois para o TCE reconfigura rotas partidárias importantes. No PSD, abre-se espaço para a emergência de novos nomes que devem herdar o capital eleitoral de Otto Filho. Nesse caso o seu irmão Daniel. No PT, o mesmo movimento acontece com Josias, que deixa um vácuo a ser ocupado por novas lideranças federais. A diferença é que o PSD parece ter esse processo mais amadurecido; o PT vai entrar na rota da divisão do pão.
Ao endurecer com Josias e aliviar para Otto Filho, a oposição faz duas coisas ao mesmo tempo. Primeiro, envia um sinal claro ao PSD: a relação é institucional, não hostil, e pode ser útil no futuro. Segundo, coloca o dedo na ferida do PT, expondo disputas mal resolvidas e a dificuldade de o partido impor uma condução política uniforme mesmo estando no governo.
No fim, a ALBA cumpre o tradicional: o de arena onde se mede força, se cobra fatura e se ajustam contas. Josias deve ser aprovado, porque o governo tem maioria. Mas passará pelo desgaste. Otto Filho praticamente já passou. No fim da sabatina já o chamavam até de Conselheiro. E essa diferença, mais do que pessoal, é profundamente política. É sobre quem tem conforto no jogo e quem ainda precisa negociar cada passo. É sobre dois pesos, duas medidas com pitadas recados para 2026. A conferir.
