Alguns comentários sobre “bobagem”

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Por Eliecim Fidelis
Tinha pensado em comentar neste artigo a recente polêmica motivada pelo livro de Pasternak e Orsi[1], mas mudei de ideia ao observar que ele trata de bobagem, pseudoafirmações e outros absurdos que não merecem ser levados a sério.

É claro que o livro incomodou as diversas áreas atingidas, mas reconhecendo o mérito da autora por ter defendido o tratamento científico à Covid, motivo pelo qual tornou-se muito conhecida, resolvi compartilhar o que pode ser visto como um reconhecimento aos que tiveram a iniciativa de comprovar o contrário do que o livro diz acerca da psicanálise.

Neurocientistas, pesquisadores e professores[2] mostraram-se surpresos pelo fato de os autores do livro não terem procurado se embasar cuidadosamente para acusar a psicanálise de não se submeter à testagem científica e apontam estudos que podem ser pesquisados nas fontes científicas mais respeitadas: o banco de dados da Cochrane Library, as revistas World Psychiatry, a Science, Science Nature, Nature Communications e Nature Schizophremia. Esta publicou estudos sobre a estrutura do discurso, inspirados na teoria psicanalítica, mostrando que o sonho é a “via régia para o inconsciente”, como disse Freud. E, assim, os autores mencionados concluem que o suposto isolamento científico atribuído pelo livro à psicanálise é um negacionismo.

Mas se a psicanálise deve agradecer aos que tiveram a iniciativa e a coragem de defendê-la, deve também cuidar-se para não cair na armadilha de adotar as mesmas ferramentas de enquadre científico utilizados por aqueles que a desqualificam, uma vez que essa mistura, em especial com o discurso psiquiátrico, só interessa à farmacologia.

No que se refere aos fenômenos com que lida a psicanálise, como submeter, por exemplo, um sonho à testagem científica regida pelos princípios aristotélicos, se o sonhador pode, ao mesmo tempo, apresentar-se chorando, desesperado e vibrando de alegria; e pode reconhecer no sonho uma pessoa amiga que ao mesmo tempo muda o rosto para o do maior inimigo?

Então, como disse o matemático Newton da Costa, no que se refere ao discurso analítico, suas inferências podem sim ser formalizadas, mas não reza pelos princípios da identidade, do terceiro excluído e da não contradição, e sim por uma lógica paraconsistente que acolhe o princípio invariante da contradição e talvez derrogue as leis clássicas.


[1] Referência ao livro Que bobagem! Pseudociências e outros absurdos que não merecem ser levados a sério, de autoria de Natalia Pasternak e Carlos Orsi. São Paulo: Contexto, 2023.

[2] Refiro-me em especial às posições de Sidarta Ribeiro, professor e pesquisador da Fiocruz e seu colega Mário Eduardo Costa Pereira, professor de psiquiatria da Unicamp.

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Psicanalista e escritor, membro do Espaço Moebius Psicanálise. fidelis.eli@gmail.com