Por Paulo Dourado
BURITY PARTIU e há muito tempo faz falta. Pra mim era Burú (porque ele era, de fato, um tipo de Guru de todos nós). Apostou em mim quando (ao lado de Theodomiro Queiroz) me entregou (eu tinha 23 anos!) a direção do I Curso Livre de Teatro do TCA. O fato é que devemos todos a ele. Nós, toda a Bahia. Mas aqui vou me referir “apenas” a todo o povo do teatro (meu povo), a quem, sempre ao lado de Theo, ele apoiou; apoiou, entenda-se, REALMENTE, com quem sabe o que faz, ou quer realmente tentar fazer da maneira correta, ou seja, valorizando e aplicando os recursos públicos com uma visão estruturante e definitiva.

Pra falar de tudo o que ele e Theo criaram, seria preciso um livro inteiro (sobretudo depois que ele foi nomeado Diretor da Fundação Cultural): Balé-Teatro Castro Alves, Sala do Coro, Espaço X, Centros Culturais do interior, OSBA, Temporadas de grandes espetáculos nacionais e internacionais, eventos, arte-educação etc, etc, etc…
Vou destacar aqui duas coisas aparentemente simples. Vejamos: eles mantiveram no TCA, durante cerca de duas décadas, entre 10 a 15 salas de ensaio, que eram disponibilizadas, gratuitamente, para todos os grupos de teatro e dança da Bahia. Essas salas eram usadas 24h por dia – pois muitas vezes ensaiávamos até de manhã – sem nenhum problema. Na real, isso significava que, diariamente, se encontravam no TCA (nas escadas, nas salas, nos corredores) centenas de artistas de teatro (200/300) que, assim (ensaiando, convivendo, trocando ideias etc.), podiam, de fato, exercer seu ofício com regularidade e, por isso, podiam CRESCER no conhecimento da sua arte.
Toda a geração dos anos 70 a (?) 90 (?) que naquelas salas ensaiou, aprendeu, cresceu e viu a sonhada luz da profissionalização se acender ao longe, se beneficiou desse apoio. Apenas isso, entre dezenas, centenas de outras ações (muitas delas esotéricas – secretas para o público) realizadas por Burity, dá uma pequena mostra da sua potência e energia criativa (o seu axé).
Todo o “boom” do teatro que aconteceu a partir de 85 – Catedrásticos, Bofetada, Oficina Condensada, Cafajestes, 1,99, Sete Pecados Captados, Pequenos Burgueses, as peças de Deolindo, Alvinho Guimarães, Manoel Lopes Pontes, Cabús e tantos outros – não existiria sem essa base. E também, como todo mundo sabe (sabe???), os nossos “famosos” Wagner, Regina Dourado, Jackson Costa, Lázaro, Vlad, Fábio, Cyria, Maria Menezes (e muitos outros) só puderam prosperar exatamente porque havia esse terreno fértil e bem cultivado.
Depois, já na Fundação, ele também, ao lado de Julieta Lomanto, apoiou (sem questionar!!!) o nosso projeto de Teatro Popular Contemporâneo, que realizou grandes espetáculos dramatizando, para grandes plateias, em palcos na rua ou em espaços tipo Concha Acústica, a história e a formação cultural da Bahia – Búzios/Alfaiates, Canudos, Lídia de Oxum, Rei Brasil etc.
Realmente espero que alguém assuma a tarefa de escrever e publicar a sua história, que, todo mundo sabe, é parte fundamental da Bahia contemporânea. Quem sabe, assim, floresçam outros Buritys, igualmente capazes de garimpar os tesouros poéticos e humanos da nossa terra, e igualmente determinados a cultivar as Artes, para fazer da Bahia, i.e., do mundo, um lugar melhor.
Valeu, BURÚ! Axé, parceiro!
(In memoriam José Augusto Burity – 1948–2025).
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Diretor de Teatro