Por Gerson Brasil
A professora doutora Edil Silva Costa, da Universidade do Estado da Bahia, no livro Cinderela nos Entrelaces da Tradição, fez uma leitura crítica dos contos orais populares da Bahia, marcando a importância desse acervo cultural e simbólico, na constituição das vivências das comunidades onde eles foram recolhidos, como contribuição à formação da pertença brasileira e a relação com igual manifestação encontrada na península ibérica e em outras partes do mundo.
Lançado ontem, 28, na Bienal do Livro Bahia, A Cinderela de Edil coteja o modo como a percepção do povo de questões como o incesto, a inveja, o absurdo, são tramadas e vivenciadas no cotidiano. “Não é o tema em si, mas a forma de abordagem que revela hábitos e costumes periféricos que nos chama a atenção”.
No caso do conto Cinderela, a percepção é multiforme, ou seja, a oralidade faz diversos registros, sem que isso impacte na transmissão da cultura popular, nem pelo lado de perdas e tão pouco na vertente de ganhos. São construções que se remetem ao domínio da palavra, o exercício do poder, o estabelecimento do lugar do sujeito na comunidade na família, enfim, uma pertença.
“É a voz desses homens e mulheres que sustenta a tradição e que garante suas continuidades, como mostra Paul Zumthor, ‘uma palavra necessária à manutenção do laço social, sustentando o imaginário’. A admiração com que recebem o interesse dos pesquisadores é graças ao desconhecimento de sua função social e do prestígio que outrora, quando a escrita não exercia ainda seu domínio sobre a mente dos homens, era bastante consolidado”.
A primeira edição do livro, resultado de uma pesquisa de Mestrado na UFBA, saiu em 1998 pela Fundação Cultural do Estado da Bahia. A pesquisadora, no entanto, continuou sua trajetória e publica agora uma segunda edição revista e ampliada. Para a nova edição, além dos contos que figuraram na primeira e das ilustrações originais de Ruy Carvalho, a autora acrescentou à antologia mais dez versões inéditas dos contos recolhidos na Bahia e novas ilustrações feitas pelo artista plástico de Alagoinhas Luiz Ramos que captam perfeitamente a atmosfera das narrativas populares.
O livro, Cinderela, Nos Entrelaces da Tradição, integra a Coleção Pós-Crítica.
Os livros da Coleção Pós-Crítica, uma parceria da Editora Mercado de Letras com o Laboratório de Edição Fábrica de Letras do Programa de Pós-Graduação em Crítica Cultural do Departamento de Linguística, Literatura e Artes da Universidade do Estado da Bahia, em Alagoinhas, celebram não apenas a política de publicação avançada de uma editora que se consolida cada vez mais por todo o Brasil, mas a capacidade de um programa do interior da Bahia em construir interlocutores nacionais e internacionais. Através dessa coleção, que esperamos ser bastante duradoura e consistente, objetiva-se através de linhas, grupos e projetos de pesquisa, no âmbito do mestrado, doutorado e estágios pós-doutorais, a publicação de coletâneas, livros autorais, edições, revistas e ampliadas, de livros relevantes para o programa, além de traduções da obra de autores africanos, asiáticos, latino-americanos, em cooperação científica, que fortaleçam a crítica cultural, pensada a partir do campo linguístico-literário e suas interfaces com o das ciências humanas. A produção, o crivo e a escolha desses livros implicam o compromisso do trabalho científico com a mediação da universidade junto a comunidades e populações excluídas da cidadania cultural no Brasil, além de passarem pelo olhar criterioso dos conselhos científicos da Editora e do Laboratório de Edição.