Por Joaci Góes
Ao amigo Manoel Machado Bisneto!
Pela quinta vez, nos últimos 19 anos, desde quando a Bahia está sendo governada pelo PT, a promessa da iminente construção da ponte ligando Salvador a Itaparica tem sido o carro chefe das campanhas vitoriosas do Partido dos Trabalhadores. Segundo pensam alguns dos mais qualificados pensadores baianos no campo da infraestrutura que interessa ao progresso dos povos, o descumprimento dessa promessa milita em favor dos mais genuínos interesses da coletividade, tendo em vista que a construção dessa ponte faraônica, segundo pensam, seria, como será, um desastre comum, por desviar recursos tão necessários em outras áreas.
Por sua gritante atualidade, transcrevemos, abaixo, artigo publicado por Joaci Góes Filho no Jornal A Tarde, edição do dia 27/10/2011, sob o título “A fantástica ponte de Itaparica.”
“Produto exclusivo do acaso, fui uma das primeiras pessoas, junto com minha mulher, Gabriela, a cruzar a ponte Malmo-Copenhague, que liga a Suécia à Dinamarca, em 3 de julho de 2000, dois dias após sua inauguração. Provavelmente, os primeiros brasileiros a fazê-lo, depois da quase brasileira rainha Silvia.
“A Ponte Oresund, como é conhecida, liga dois pequenos países cujos PIBs combinados são de causar inveja ao nosso. Apesar da pequena distância que os separa, cerca de 14 quilômetros, seus governantes só vieram considerar esse investimento de 12 bilhões de dólares (valores atualizados), há 18 anos, quando prioridades maiores, como educação, saúde, saneamento e infraestrutura básica já haviam sido atendidas, satisfatoriamente.
“Hoje, no Brasil, mais especificamente na Bahia, cresce perigosamente a crença de que a ponte Salvador-Itaparica, quase da mesma extensão da Oresund, é um empreendimento importante e benéfico para nossa sociedade, já maduro para ser implementado. Diante dessa constatação, sinto-me no dever de somar minha voz à de quantos partilham do entendimento de que se trata de lamentável equívoco, argumentando, para evitar a consumação de erro tão grave, inspirado no pensamento de que o mal prospera diante do silêncio das pessoas de bem. Como me considero uma pessoa de bem, desprovida de quaisquer outros interesses políticos e ou empresariais, sinto-me, por isso, legitimado para combater a grave insensatez que é este investimento, diante de tantas outras gritantes prioridades do nosso povo.
“Preocupam-me os erros que cometemos hoje, destinados a agravar, ainda mais, o palco da vida futura de nossos filhos. Como justificar a construção de uma obra tão cara quanto adiável, quando salta aos olhos que vivemos numa sociedade onde a saúde, a educação e a segurança pública entraram em colapso? E o que dizer de tantas obras de infraestrutura tão necessárias ao conforto e à vida das pessoas, como o saneamento básico, cujas deficiências afetam, preocupantemente, tantas pessoas de nosso Estado, e o transporte de massa concebido para melhorar o, cada vez mais, caótico trânsito da Região Metropolitana de Salvador? O projeto do metrô, que já dura incríveis 12 anos, de tão antigo, já está defasado, e os trens, enferrujados. Será que alguém acha mesmo que a ponte custará, apenas, sete bilhões de reais? Haverá ingênuos que acreditem que essa obra faraônica estará concluída em quatro anos? Existe alguém, minimamente informado, que já não saiba quem será o consórcio vencedor? Como explicar o silêncio das entidades de classe da Bahia sobre a momentosa questão?
“Recentemente, ouvi na FIEB um mirabolante plano segundo o qual os recursos para investimento na ponte não seriam oriundos dos impostos estaduais ou federais, mas do lucro obtido entre o valor da desapropriação de uma substancial área da ilha, pelos preços de hoje, e a valorização futura. Um fundo formado a partir dessa diferença seria usado para financiar sua construção. Esse discurso durou pouco, pois, infelizmente, esta é uma daquelas muitas ideias que no papel fazem sentido, mas que, na prática, não se sustentam.
“Como resulta patente que o pedágio, apenas, não será suficiente para atrair investidores nacionais ou internacionais, o que, por si só, comprova sua mais completa inviabilidade econômico-financeira, engana-se quem quiser: a ponte será bancada por mim e por você, que não temos o poder de decidir sobre a aplicação de nosso dinheiro. Ficaremos a assistir à desenfreada e desnecessária gastança que ocorrerá em todas as suas etapas até o fim de sua construção.
“O previsível investimento por parte do poder público estadual e federal equivale, numa simples analogia popular, ao de um casal classe média-baixa, com dois filhos em escola pública, pai desempregado, mãe num emprego mal remunerado, como o de enfermeira ou professora, usuários de transporte coletivo, e que acaba de receber uma pequena herança. Após muita reflexão sobre como gastar o valor recebido, um olha para o outro e diz: já sei, amor, vamos comprar uma lancha!

