Por Victor Pinto
Há figuras que não passam pela vida: elas permanecem. Padre Elias Cedraz é uma dessas presenças marcantes que o tempo não apaga. Filho do distrito de Juazeirinho, em Conceição do Coité, ele acaba de completar 81 anos de vida e 50 anos de ministério sacerdotal. São marcos de uma caminhada pela firmeza, pela ternura pastoral e por um olhar profundamente comprometido com o social, o humano, o povo.
A minha adolescência e juventude foram atravessadas por sua presença firme e generosa à frente da Paróquia Nossa Senhora da Conceição do Coité, interior da Bahia. Um tempo em que a Igreja, com ele, não se fechava nas paredes do templo. Estava nas ruas, nos palcos, nas praças. Era uma igreja que refletia, que se emocionava, que encenava a dor e a esperança — como nas memoráveis Vias Sacras, que mobilizavam a cidade inteira. Liturgia impecável, homilias contundentes, mas sempre com um olhar plural, nunca autocentrado.
Padre Elias foi mais que pároco. Foi educador de consciências, formador de cidadanias. Promoveu as Semanas Sociais e Cidadãs, trouxe o Grito dos Excluídos para dentro da alma de Coité, incentivou a cultura, o teatro, a palavra crítica. Ali, vi nascer minha vocação para o jornalismo. Aos 12 anos, quando iniciei o projeto do Correio do Mês de Coité, ele foi o primeiro a me levar a sério. Sempre dizia que eu seria um jornalista. “Suas palavras vão ser lidas e ouvidas por muita gente”, repetia com a tranquilidade de quem enxerga além. E mais: me ensinava que o jornalismo, assim como a política, é instrumento de transformação.
Claro que, como toda relação verdadeira, tivemos nossos embates. Às vezes, os rompantes juvenis batiam de frente com sua firmeza serena. Mas a fraternidade sempre falou mais alto. Padre Elias nunca foi de guardar mágoas; era de guardar gente. Acolhia, escutava, provocava reflexões — sempre com um sorriso.
Lembro bem do período em que a saúde dele fragilizou, em 2009. Estivemos juntos em Salvador, na missa em ação de graças pela vitória sobre o câncer. Foi um momento de fé celebrada com intensidade, de vida renovada. Para celebrar, pedi ao cartunista Osmani Simanca que fizesse uma caricatura de Padre Elias. Nós dois éramos fãs das charges dele no A Tarde. Ríamos juntos, até das críticas à própria Igreja.
Apesar da experiência acumulada, de uns tempos pra cá a Diocese de Serrinha, principalmente as paróquias centradas em Coité, poderia aproveitá-lo melhor. Um padre com a história, a experiência e a lucidez de Elias merecia continuar fazendo mais.
Celebramos seus 81 anos e meio século de sacerdócio com gratidão e reverência. Porque sua vida não tem sido apenas longa: foi fecunda. Tocou vidas, formou consciências, inspirou escolhas, fortaleceu famílias, reanimou esperanças. Um padre que, mesmo sem mitra, sempre foi pastor. Um servo que não se acomodou. Um homem que sempre combate o bom combate.
Obrigado, Padre Elias. Seu legado permanece entre nós, como chama acesa que aquece e ilumina. Que venham mais anos de saúde e sabedoria. E que a vida lhe devolva, em amor, tudo o que nos deu em entrega.