A inominável violência das ruas

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Por Joaci Góes
(Aos amigos Maria Clara e Ricardo Alban)
A conceituação do que seja um padrão de normalidade varia em função do conjunto dos valores de uma determinada conjuntura social, daí advindo distintas conclusões do que seja bom ou ruim, para as respectivas populações.

O patológico ambiente de insegurança física que se vive no Brasil, em geral, e na Bahia, em particular é representativo dessa verdade palmar. O cidadão bovinamente comum, desabituado a distinguir entre o que seja normal e ou patológico não compreende quando ouve dizer que, estatisticamente, uma pessoa em Salvador corre o risco 128 vezes maior de ser assassinada do que outrem que vive numa cidade europeia.

Se é possível extrair-se algum bem de um grande mal, a galopante violência que se repete a cada dia em Salvador, como em outras regiões do Estado, tem tido o condão de pôr em alerta os instintos de sobrevivência de gregos e baianos. No centro de tudo, a ingênua tendência de buscar bodes expiatórios onde der na telha de cada um, sendo muito raros os que percebem com nitidez meridiana que, apesar de ser, aparentemente múltipla, a causa predominante, quase única, desses males reside em nosso precário sistema educacional, cada dia mais distante do exercício de sua função transformadora, em ambiente de paz social, como já é do domínio das nações mais avançadas de que, a cada dia, nos distanciamos em nossas práticas individuais e coletivas.

Na sociedade do conhecimento em que todos nos encontramos inapelavelmente imersos, dar as costas para o aprendizado como uma regra geral de conduta significa optar pela marginalidade, no sentido estrito e lato de aceitar um padrão de vida inferior ao dominante, com o cortejo de suas consequências. É claro que bons valores são o segundo elemento que compõe o conceito do que seja uma educação de qualidade para habilitar as pessoas ao êxito social, segundo critérios dominantes.

A ingenuidade de muitos acredita que a solução estaria no aparelhamento crescente das estruturas repressoras do crime, com predominância de contingentes policiais cada vez mais bem equipados, como se imaginou ao tempo da decadência do Império Romano, cada vez mais tomado pela violência da marginalidade de milicianos, postura que levou o poeta romano Juvenal (60-127) a indagar Sed quis Custodiet ipsos custodes? (E quem montará guarda aos guardas?)

O argumento do pragmatismo insubsistente e irresponsável é sempre o mesmo: “O problema é que os resultados oriundos da educação demandam um tempo longo demais, maior do que podemos esperar”. Melhor e mais honesto seria dizer que “a tarefa de educar exige um tempo que ultrapassa o que dispomos para vencer as próximas eleições”. Foi pensando nessa dolorosa realidade palmar que Winston Churchill insculpiu no bronze do tempo estas palavras candentes: “Enquanto o político age pensando nas próximas eleições, o estadista atua de olho nas próximas gerações”. Com o povo deseducado que possuímos, a maioria dos eleitores vota em políticos, sendo minoritários os que sufragam estadistas.

Essa lamentável postura explica a distância abissal entre o que o Brasil é e o que deveria ser, levando em conta as enormes riquezas naturais que possuímos. Se fôssemos um país que prioriza, a todos, pobres e ricos, o acesso a uma educação de alta qualidade, seríamos uma nação com uma qualidade de vida equivalente à de países como os Estados Unidos, Canadá e Austrália, para nos restringirmos aos que possuem grande e rica base territorial.
Nunca é demais repetir com Joseph de Maistre(1753-1821): “Cada povo tem o governo que merece.”